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A urgência do controle de ruído nas cidades brasileiras

Por Davi Akkerman, presidente do 54ª Inter-Noise - Congresso e Exposição Internacional sobre Engenharia de Controle de Ruído 


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A poluição sonora é uma das formas mais negligenciadas de degradação ambiental nas cidades brasileiras. Embora seus efeitos sejam invisíveis, eles são profundamente sentidos — no corpo, na mente e na qualidade de vida. O ruído urbano, tratado há décadas como mero incômodo, precisa ser reconhecido como uma questão de saúde pública urgente. Esta discussão tem envolvido profissionais das diversas áreas de controle acústico, além da fundamental participação de arquitetos, médicos otorrinos, representantes do poder público e de cidadãos da sociedade civil.


Nos últimos meses, moradores de diferentes regiões da cidade de São Paulo formaram uma coalizão - a Frente Cidadã pela Despoluição Sonora - mobilizados em torno desse problema que afeta diretamente a saúde pública: a poluição sonora urbana. 


O contexto atual dessa batalha é promissor, apesar de ao longo dos anos acompanharmos inúmeros debates, elaboração de manifestos, audiências públicas e a criação de leis − como a municipal de nº 16.499, que obriga a prefeitura de São Paulo a criar um mapa de ruído da cidade, sancionada em 2016−, mas que até hoje sequer o projeto saiu do papel. Enquanto isso, o Programa de Silêncio Urbano (PSIU) atua de forma limitada, respondendo apenas a denúncias pontuais, sem capacidade de monitoramento em larga escala.


A Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta que o ruído excessivo não apenas afeta a audição, mas também desencadeia doenças cardiovasculares, distúrbios neurológicos, problemas digestivos, insônia, estresse crônico e até risco de morte. Em áreas urbanas, o limite seguro é de 55 decibéis (dB), segundo a OMS. Em São Paulo, esse valor é frequentemente ultrapassado, especialmente nas vias de tráfego intenso. Dentro de residências, o ideal para dormitórios é de 35 a 40 dB — uma meta distante da realidade.


O principal vilão é o tráfego de veículos. Carros, ônibus, caminhões e, sobretudo, motocicletas emitem ruídos que ultrapassam os limites seguros. Embora a indústria automotiva tenha avançado com veículos mais silenciosos e a promessa dos elétricos, a frota brasileira ainda é majoritariamente barulhenta. E a gestão pública do ruído urbano não acompanha essa evolução.


Além do trânsito, há as chamadas fontes pontuais: bares, casas de shows, arenas esportivas e eventos que misturam música e futebol. Essas atividades impactam diretamente a saúde e o bem-estar dos moradores do entorno, além de desvalorizar imóveis e gerar conflitos urbanos.


A boa notícia é que a tecnologia pode ser uma aliada poderosa. Sistemas de inteligência artificial e o machine learning já permitem a criação de mapas de ruído dinâmicos, com sensores espalhados pela cidade identificando fontes sonoras em tempo real. Fiscalizar veículos barulhentos automaticamente, como se faz com radares de velocidade, é uma possibilidade concreta. Monitoramentos de baixo custo também podem ser uma ferramenta poderosa para comunidades afetadas por obras e eventos, garantindo que os limites acústicos sejam respeitados.


Nesse cenário, acontecerá entre os dias 24 e 27 de agosto, São Paulo (SP) a 54ª edição do Inter-Noise - um dos maiores congressos internacionais sobre engenharia acústica e controle de ruído, que surge como um espaço essencial para o avanço da engenharia de controle de ruído. Reunindo especialistas de todo o mundo, o evento promove o intercâmbio de ideias, pesquisas e soluções em diversas áreas — desde equipamentos silenciosos até políticas públicas e gestão ambiental.


O Inter-Noise não é um ponto final, mas parte de um processo contínuo de aprimoramento. A cada edição, pesquisadores retomam linhas de investigação já iniciadas, compartilham descobertas e impulsionam a evolução tecnológica e científica na área. É um verdadeiro caldeirão de saberes, onde se discutem desde os efeitos dos ruídos na saúde até estratégias para sua mitigação.


Enquanto países europeus avançam com políticas públicas eficazes e tecnologias de monitoramento, o Brasil ainda engatinha. Sem legislação robusta, sem fiscalização eficiente e sem vontade política, continuaremos convivendo com uma “pandemia de ruído” que afeta milhões de brasileiros.


O silêncio não é luxo. É direito. E o controle de ruído precisa deixar de ser pauta técnica para se tornar prioridade política.


Fonte: Alzira Hisgail e Eduardo Gomes - Ateliê de Textos  


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