Profissionais da área de arquitetura e engenharia explicam a importância das esquadrias para a vedação e o isolamento térmico
*Por Emanuelle Ormiga, sob supervisão da profissional habilitada Stephanie Fazio
Em 25 de junho, no início da onda de frio que percorre o país, uma publicação no twitter de Jefferson Nascimento, doutor em direito internacional pela USP, esquentou a discussão sobre conforto térmico: "Há uns quinze anos, conversando com um professor alemão, natural de Kiel (norte da Alemanha), achei graça quando ele disse que nunca tinha passado tanto frio na vida quanto durante uma visita a Curitiba".
Nos comentários, usuários da rede social que moram em diversas cidades do Sul concordaram com o professor alemão. Um deles disse ter passado menos frio nos 12 anos que viveu na Rússia. Outra, que um cunhado suíço sofria mais dentro de casa, em São Paulo, do que em sua terra natal. Outro, ainda, que enfrentou -20ºC em Boston (estado norte-americano), mas congelava mesmo em Florianópolis (SC).
O que explica esse desconforto das edificações brasileiras são questões culturais, econômicas e territoriais, percorrendo diversas zonas climáticas. No Brasil, existe uma norma de desempenho, a NBR 15575 – Desempenho de Edificações Habitacionais, atualizada em 2013 e em 2021, que em teoria estabelece diretrizes de conforto térmico que variam de região para região.
De acordo com Tânia Nunes Galvão Verri, arquiteta e urbanista, vice-presidente da região Sul do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) e presidente do núcleo Maringá do IAB, a norma trata do estabelecimento de regras para garantir o conforto e a segurança de qualquer imóvel residencial. Foram determinadas utilizando como referência a NBR 15220 – Desempenho Térmico de Edificações, norma que apresenta recomendações quanto ao desempenho térmico de habitações unifamiliares de interesse social, aplicáveis na fase de projeto.
“O desempenho térmico de edificações é associado ao zoneamento bioclimático brasileiro e às normas, que estão em processo de constante discussão e avaliação, registrando que atualmente encontra-se em revisão o novo zoneamento bioclimático brasileiro”, afirma a arquiteta.
Carolina de Rezende Maciel, professora doutora da Universidade Presbiteriana Mackenzie, especialista em sustentabilidade na Arquitetura e Urbanismo, explica que a NBR 15575 é dividida em seis partes, sendo que a parte cinco é a que trata especificamente do desempenho térmico das edificações. Além disso, relata que cada zona bioclimática possui requisitos específicos, como:
- Transmitância térmica de elementos construtivos: A norma estabelece requisitos para a transmitância térmica de paredes, coberturas, pisos e esquadrias, que determinam a quantidade limite de calor que pode ser transferida através desses elementos, de acordo com a cor de cada superfície (absortância térmica). Quanto menor a transmitância térmica, melhor será o isolamento térmico e maior será a eficiência energética da edificação.
- Capacidade térmica de elementos construtivos: A capacidade térmica de um componente construtivo refere-se à sua habilidade de armazenar calor. Em outras palavras, é a quantidade de calor que um material ou elemento da construção pode absorver e reter quando exposto a variações de temperatura.
- Percentual de abertura para ventilação: A norma estabelece um tamanho mínimo de vão livre disponível para a ventilação dos Ambientes de Permanência Prolongada, de acordo com a zona bioclimática onde o projeto está sendo desenvolvido. É necessária atenção ao cálculo para o atendimento deste requisito, haja vista que a área de ventilação normalmente corresponde a uma parcela menor do vão-luz da esquadria, variando conforme o modelo definido em projeto.
- Percentual de elementos transparentes: A norma estabelece um tamanho máximo de área de elementos transparentes para Ambientes de Permanência Prolongada, de acordo com a zona bioclimática onde o projeto está sendo desenvolvido. Entende-se, neste caso, que os envidraçados configuram-se como pontos frágeis termicamente da fachada, podendo resultar num ganho de calor excessivo em climas mais quentes ou em uma perda de calor excessiva em climas frios.
A professora acrescenta que é possível realizar o atendimento a estes requisitos de duas formas distintas, sendo eles: “Procedimento simplificado”, que avalia o desempenho térmico da Unidade Habitacional por meio de comparação de características geométricas dos Ambientes de Permanência Prolongada e de propriedades térmicas dos sistemas construtivos em relação aos valores de referência destes parâmetros; e “Simulação computacional”, por meio de softwares de simulação termoenergética – no caso do não atendimento de algum critério do procedimento simplificado, por um ou mais Ambientes de Permanência Prolongada, toda a avaliação da Unidade Habitacional deve ser realizada por meio do procedimento de simulação computacional.
MATERIAL DAS ESQUADRIAS MAIS INDICADOS
“No desenvolvimento do projeto, ao especificar esquadrias, o arquiteto considera inúmeros fatores técnicos e compositivos, e, independentemente do material que a compõe, o dado mais importante é como se dará o conjunto da esquadria e sua montagem”, explica Tânia. Nesse sentido, ela afirma que há dependência de diversos fatores, como: espessura dos materiais; qualidade da execução do conjunto, principalmente eliminando ou evitando frestas; o tipo do vidro; e as interfaces da instalação da esquadria na obra.
Para locais mais frios do Brasil, como a região Sul, Carolina conta que, juntamente à escolha do material, é necessário observar os requisitos expostos na NBR 10821 – Esquadrias Externas para Edificações, que especifica as características para fabricação e instalação deste componente. No tocante à escolha do material, são vários os aspectos a serem observados, pois a escolha depende de vários fatores, incluindo o clima, o orçamento disponível, a estética desejada e as necessidades específicas de cada projeto. Abaixo, a especialista elenca pontos positivos e negativos dos principais materiais utilizados nas esquadrias e as características que deve-se considerar para o contexto de regiões com clima mais frio:
Alumínio:
- Pontos positivos: O alumínio é um material leve, durável e resistente à corrosão, o que o torna ideal para regiões úmidas e com chuvas frequentes. Também é fácil de limpar e possui diversas opções de acabamentos e cores.
- Pontos negativos: Em se tratando de um material considerado bom condutor térmico, seu uso pode resultar em pontes térmicas. Este fenômeno caracteriza-se pela transferência de calor entre o ambiente interno e externo, o que pode resultar em desconforto térmico em climas predominantemente frios.
PVC (Policloreto de Vinila):
- Pontos positivos: O PVC é um material com baixa condutividade térmica, o que ajuda a reduzir as perdas de calor para o exterior e a evitar a formação de condensação nas esquadrias. Além disso, sua boa estanqueidade faz desta uma escolha de componente construtivo com isolamento acústico e boa durabilidade.
- Pontos negativos: Dependendo da região do país, esquadrias de PVC podem ser mais caras em comparação com as de alumínio ou madeira, e podem apresentar limitações em termos de cores e acabamentos.
Madeira:
- Pontos positivos: Por ser um material de baixa densidade, isto é, com ar contido entre a sua estrutura microscópica, a madeira é um excelente isolante térmico, o que ajuda evitar a perda de calor e manter o ambiente interno mais quente em locais frios. Além disso, proporciona um aspecto estético agradável e é um material renovável, o que lhe confere uma característica de baixo impacto ambiental, desde que sejam observados seu adequado cultivo e manejo.
- Pontos negativos: A madeira requer mais manutenção e cuidado para evitar danos por insetos, umidade ou deterioração. Em regiões com alta umidade, a madeira pode não ser a melhor opção, a menos que seja tratada adequadamente (impermeabilização, secagem e/ou tratamentos químicos).
“Resumindo, em locais mais frios como a região Sul do Brasil, as esquadrias de PVC e madeira são boas opções para proporcionar maior conforto térmico, pois têm baixa condutividade térmica e ajudam a minimizar a transferência de calor entre o ambiente interno e externo”, finaliza Carolina.
O VIDRO DUPLO PODE AUXILIAR NO CONFORTO TÉRMICO?
Fernando Simon Westphal, consultor técnico da Associação Brasileira das Indústrias de Vidro (Abividro), engenheiro civil, professor, pesquisador e colunista da CONTRAMARCO, explica que a câmara de ar do vidro duplo, também conhecido como insulado, atua como um isolante térmico, diminuindo a troca de calor através da composição de vidro. Dessa forma, em clima frio, o vidro duplo diminui a perda de calor do ambiente interno para o externo. Em clima quente ocorre o contrário, e o vidro duplo atua diminuindo o ganho de calor do ambiente externo para o interno.
Como consequência, o vidro interno fica com temperatura mais próxima do ar da edificação. “Isso evita o desconforto térmico das pessoas próximas ao vidro, tanto no verão, quanto no inverno”, afirma o consultor, acrescentando que esse desconforto é explicado pelo fenômeno da assimetria de radiação, que ocorre quando uma das superfícies do ambiente está muito mais quente ou muito mais fria do que as demais. “Mesmo que o ambiente esteja climatizado, se houver o desequilíbrio entre a temperatura das superfícies, ocorrerá a sensação de desconforto. No caso de esquadrias ou fachadas com vidros monolíticos ou laminados, isso pode ocorrer em climas extremos, sejam frios ou quentes. O vidro duplo corrige esse problema”, finaliza Westphal.
No entanto, Carolina ressalta que o vidro insulado por si só não é a única solução para melhorar o conforto térmico. Outros fatores, como o projeto arquitetônico, o isolamento das paredes, a vedação adequada das esquadrias e a orientação da edificação em relação ao sol, também influenciam significativamente o desempenho térmico de um ambiente. “O uso adequado de vidros insulados, aliado à uma abordagem integrada de arquitetura bioclimática e eficiência energética, é fundamental para garantir um ambiente interno mais confortável e reduzir o consumo de energia para a climatização”, conclui.
COMPONENTES NA VEDAÇÃO DA ENTRADA DE AR
Nesse quesito, Tânia, presidente do núcleo Maringá do IAB, pontua que os componentes que fazem parte das esquadrias são fundamentais para garantir o bom isolamento térmico, acústico e proteção contra as intempéries. No que diz respeito à vedação da entrada de ar nas esquadrias, a norma técnica NBR 10821 estabelece alguns itens principais que são fundamentais para garantir o conforto térmico e, consequentemente, a eficiência energética dos ambientes.
Carolina, professora da Universidade Presbiteriana Mackenzie, destaca os componentes: borrachas de vedação; batentes; vedantes de EPDM (Etileno-Propileno-Dieno Monômero); barras de apoio ou calços; e trincos, fechos e dispositivos de pressão.
POR QUE AS ESQUADRIAS DE PVC SÃO MAIS CARAS NO BRASIL?
As esquadrias de PVC podem ser mais caras no Brasil por diversos motivos, e alguns deles estão relacionados a desafios na demanda e produção deste material, de acordo com Carolina. “No passado, as esquadrias de PVC costumavam ser mais caras no Brasil em comparação com as esquadrias de madeira, principalmente devido ao custo da matéria-prima e à tecnologia de produção”, explica. No entanto, ao longo dos últimos anos, com o desenvolvimento da indústria e o aumento da oferta de esquadrias de PVC, os preços podem ter se tornado mais competitivos.
Os seguintes fatores explicam esta situação: menor demanda; tecnologia e matéria-prima; importância da matéria-prima; e tecnologia e equipamentos. “É importante ressaltar que esses fatores podem variar ao longo do tempo e de acordo com as condições econômicas do país. Além disso, a escolha de esquadrias deve levar em consideração não apenas o preço, mas também outros aspectos, como a durabilidade, o conforto térmico e acústico, além do design e da estética desejada para o projeto”, completa a professora da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
AS DIFERENÇAS DE DESEMPENHO TÉRMICO ENTRE UMA OBRA EM ALVENARIA E UMA EM DRYWALL
O desempenho térmico depende diretamente das propriedades térmicas dos materiais, como absortividade, refletividade, emissividade e transmissividade, e de seus parâmetros térmicos, entre eles, condutividade térmica, resistência térmica, transmitância térmica e densidade de fluxo de calor.
Tânia destaca que a condutividade térmica e a absortância são determinantes para o desempenho dos fechamentos, ou seja, materiais com menor condutividade térmica, como lã de vidro, lã de rocha, poliestireno expandido ou extrudado são muito bons isolantes térmicos, além da aplicação de cores claras que apresentam menores absortâncias para a radiação solar.
No que diz respeito à condutividade térmica, as soluções em alvenaria, como tijolos e blocos de concreto, são dotadas de alta condutividade. Isso significa que eles conduzem facilmente o calor, permitindo que o calor externo ou interno passe através das paredes, afetando a temperatura interna. Já as soluções de drywall, por serem compostas por placas de gesso acartonado com núcleo de gesso, apresentam uma condutividade térmica mais baixa em comparação com a alvenaria. “O drywall tem menor capacidade de condução de calor, contribuindo para um melhor isolamento térmico”, acrescenta Carolina.
Em relação à inércia térmica, a professora explica que as soluções em alvenaria geralmente possuem alta inércia térmica, ou seja, ela tem a capacidade de absorver e armazenar calor. “Isso pode resultar em um atraso na transferência de calor para o interior da edificação, o que pode ser benéfico por proporcionar temperaturas mais estáveis e amortecer as variações térmicas diárias”, completa. As soluções em drywall possuem baixa inércia térmica, o que significa que elas respondem mais rapidamente às variações de temperatura externa. “Isso pode levar a uma temperatura interna mais próxima à temperatura externa (menor amortecimento), o que pode exigir mais esforço do sistema de climatização para manter o conforto térmico.”
Carolina complementa dizendo que as pontes térmicas são importantes pontos a serem considerados em regiões de climas frios. As soluções em alvenaria podem apresentar pontes térmicas devido às juntas de argamassa e detalhes construtivos, que podem permitir a transferência de calor entre o interior e o exterior. Em uma solução em drywall, quando bem executada, pode-se evitar a formação de pontes térmicas significativas, desde que sejam utilizados materiais e técnicas adequadas de construção.
Por fim, outro aspecto a ser considerado é a espessura das paredes. As paredes de alvenaria são geralmente mais espessas do que as paredes em drywall, o que pode proporcionar um maior isolamento térmico natural. No entanto, também podem ocupar mais espaço interno.
POSIÇÃO DO IMÓVEL EM RELAÇÃO À INCIDÊNCIA SOLAR
Para Carolina, a escolha da posição do imóvel em relação à incidência solar é um fator de extrema importância no projeto arquitetônico, pois tem efeitos significativos no conforto térmico e na qualidade de vida dos moradores. “A posição do imóvel em relação ao sol afeta diretamente a quantidade de luz natural que entra nos ambientes, a ventilação e a quantidade de radiação admitida para dentro da edificação e, consequentemente, a temperatura interna resultante”, afirma. Além disso, explica que o consumo de energia para climatização pode variar significativamente de acordo com o posicionamento da edificação em relação à trajetória do sol.
“Sobretudo, acho importante destacar o papel dos arquitetos na concepção de edificações ambientes sustentáveis, confortáveis e energeticamente eficientes”, completa a professora. “Para alcançar tal objetivo, é fundamental priorizarmos a adoção das estratégias bioclimáticas, que são abordagens que buscam utilizar as condições climáticas e características naturais do local a favor do projeto, maximizando o aproveitamento de recursos naturais, reduzindo o consumo de energia e minimizando o impacto ambiental”, finaliza.
Fonte: Tab Uol
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